Estamos a 6 meses do aniversário de 100 anos de um dos eventos mais trágicos e históricos dos últimos dois séculos: o naufrágio de Titanic, em sua viagem inaugural através do oceano Atlântico em abril de 1912.
E não foram só pessoas que afundaram, mas também muitos objetos. Várias pessoas conhecem itens famosos que estavam a bordo do navio, alguns inclusive retratados no filme de 1997, “Titanic”, incluindo o automóvel Renault que deveria ser enviado para os Estados pelo seu proprietário, William Carter, e pinturas caras que Rose Dawson estava carregando com ela.
Embora no filme as pinturas fossem de impressionistas franceses, o quadro real perdido quando o navio afundou era uma pintura a óleo de Blondel, “La Circasienne Au Bain”, reclamada pelo seguro de 174.000 reais.
O manifesto de objetos a bordo do Titanic foi entregue ao seu navio irmão, Mauritânia. Ele sobreviveu porque tinha sido enviado para a América através de correio registrado. Indenizações de seguros documentam ainda mais itens perdidos. Então confira dez dos objetos menos conhecidos que afundaram com o Titanic naquela noite fatídica, junto com algumas histórias interessantes das pessoas associadas a eles:
1 – PELE DE COELHO
O navio possuía três caixas de pele de coelho levadas para a companhia The Broadway Trust, de New Jersey. As peles de coelho eram usadas na época para alinhar roupas e casacos para crianças.
A companhia Broadway Trust era um banco que funcionou até pouco depois do início da Grande Depressão, quando muitos pequenos bancos fecharam suas portas. Sua história traz um pouco de má sorte. Em 5 de outubro de 1920, o mensageiro da Broadway Trust, David S. Paul, desapareceu misteriosamente enquanto carregava dezenas de milhares de dólares em dinheiro e títulos. Seu corpo foi encontrado em 16 de outubro. Ele havia sido sequestrado, assassinado e roubado por dois conhecidos, Frank J. James e Raymond Schuck, que foram julgados e condenados por seu assassinato, e executados na cadeira elétrica em New Jersey, em 30 de agosto de 1921.
2 – ÓPIO
A bordo do Titanic estavam quatro caixas de ópio. Também nele estava John Jacob Astor IV, o bisneto de John Jacob Astor, cuja fortuna foi feita em cima do ópio, do comércio de peles e do setor imobiliário.
Nem ópio, nem Astor chegariam à Nova York. Apenas sete anos antes do naufrágio do Titanic, o Congresso dos EUA tinha proibido o ópio, que ainda era amplamente utilizado em todos os tipos de medicamentos e misturas. Um ano depois, o Congresso dos EUA aprovou a Lei de Alimentos e Medicamentos Puros, exigindo rotulagem do conteúdo dos medicamentos pelas empresas farmacêuticas. Como resultado, a disponibilidade de opiáceos diminuiu significativamente.
Em 1909, a primeira proibição de drogas federal foi aprovada pelo Congresso, proibindo a importação de ópio. Por alguma razão, o ópio ainda estava sendo enviado para os EUA em 1912, quando o Titanic afundou. Dois anos mais tarde, em 1914, o Congresso aprovou a Lei de Narcóticos Harrison, que tentou conter o vício de drogas (especialmente cocaína e heroína), exigindo que médicos, farmacêuticos e outros que prescreviam drogas se registrassem e pagassem imposto.
3 – UM CÃO CHOW
Outro passageiro de primeira classe do navio era Harry Anderson, um corretor da bolsa de Nova York, que estava voltando para a América depois de uma visita à Inglaterra. Ele era casado e morava em Nova York com sua esposa, que não tinha feito a viagem à Europa com ele.
Aparentemente, no entanto, ele tinha companhia: um cão de estimação. Anderson sobreviveu ao naufrágio, escapando no bote salva-vidas de número 3. Seu cão, no entanto, afundou juntamente com 8 dos 12 outros cães que estavam no Titanic. Mais tarde, Anderson reivindicou um seguro no valor de 87 reais pela perda de seu cão Chow.
4 – RETRADO ASSINADO DE GARIBALDI
Emilio Giuseppe Ilario Portaluppi foi um dos sobreviventes mais interessantes do naufrágio do Titanic. Ele era um passageiro de segunda classe indo para Milford, New Hampshire, depois de uma visita à Itália, país de seu nascimento.
Ele afirma que foi despertado pela força do navio batendo no iceberg, e inicialmente pensou que o navio tinha atracado em Nova York. Ele logo percebeu que algo estava errado, colocou um colete salva-vidas, e foi para o convés. Ele afirma que escorregou ou tropeçou ao tentar saltar em um bote salva-vidas e mergulhou na água. Outros afirmam que ele pulou no mar.
Ele foi um dos afortunados (dentre quatro pessoas) que foram resgatados pelo único salva-vidas que voltou à busca de vítimas após o Titanic afundar. Dizem que Emilio se segurou num pedaço de gelo e flutuou até ser resgatado.
Depois que ele foi salvo e voltou para os EUA, apresentou uma reivindicação de seguro de 5.240 reais pela perda de uma foto do ídolo nacional italiano Giuseppe Garibaldi, assinado por Garibaldi. Esta afirmação parece quase tão fantástica quanto sua sobrevivência em um pedaço de gelo, mas quem sabe?
5 – ANOTAÇÕES DE FACULDADE
Não se sabe muito sobre o jovem passageiro de segunda classe Sidney Clarence Stuart Collett. Ele parece ter sido um estudante de Teologia, a caminho da Inglaterra para encontrar os pais em Nova York.
Dizem que o jovem participou de um dos eventos mais memoráveis pouco antes do naufrágio. Collett estava ajudando o reverendo Carter na noite de domingo a realizar uma missa no Titanic. O culto foi realizado na noite de 14 de abril de 1912, no salão de jantar de segunda classe, e foi assistido por cerca de 100 passageiros.
No encerramento do evento, o reverendo Carter observou que o navio estava invulgarmente estável e como todos estavam ansiosos para sua chegada em Nova York.
Depois que o navio bateu no iceberg, tudo o que se sabe é que Collett ajudou duas mulheres a pegar o bote salva-vidas. Conforme as mulheres estavam prestes a entrar no bote, Collett explicou à tripulação que elas haviam sido confiadas aos seus cuidados. Collett teve permissão para se juntar a elas no bote salva-vidas número 9 e foi salvo.
Ao chegar nos EUA, Collet supostamente encontrou seu irmão, e a primeira coisa que fez foi lhe dar uma pequena Bíblia. Aparentemente, seu irmão tinha dado a Bíblia a Collett antes de partir para a Inglaterra, dizendo que ele deveria devolvê-la na próxima vez que se encontrassem.
Collet, então, fez uma reivindicação de seguro no valor de 87 reais pela perda de anotações a mão sobre aulas de faculdade de um curso de 2 anos.
6 – GAITA DE FOLES
O irlandês Eugene Patrick Daly, de 29 anos, era um passageiro de terceira classe para Nova York. Quando ele embarcou, estava com uma gaita de foles irlandesa, instrumento tradicional do país, e diz-se que tocou “Lament Erin” para seus companheiros. Mais tarde, Daly pediu 87 reais pela perda do instrumento. Décadas mais tarde, um conjunto de gaitas de foles, possivelmente pertencentes a Daly, foi recuperado no local do naufrágio.
À medida que o Titanic estava afundando, Daly foi um dos afortunados passageiros da terceira classe que conseguiu chegar do fundo do navio ao convés. Com ele, na época, estavam duas mulheres, Maggie Daly e Bertha Mulvihill. Ele as ajudou a bordo do bote número 15 e foi deixado para trás.
Daly relatou um dos momentos mais dramáticos a bordo do navio pouco antes de afundar: “Um oficial apontou um revólver e disse que se qualquer homem tentasse entrar nos botes, iria matá-lo no local. Eu o vi atirar e matar dois homens porque eles tentaram entrar no barco. Depois houve um outro tiro, e eu vi o oficial deitado no convés. Me disseram que ele atirou em si mesmo, mas eu não vi”.
Daly pulou no mar com apenas o casaco pesado que tinha para mantê-lo quente o suficiente para sobreviver na água gelada. De alguma forma, ele conseguiu chegar a um barco, e foi salvo. Mais tarde, ele alegou que sempre levava o mesmo casaco quando viajava, por sorte.
7 – MÁQUINA DE MARMELADA
Marmelada é um “melado” feito a partir do suco e das cascas de frutas cítricas, fervida com açúcar e água. Ela pode ser feita de limões, limas ou outras frutas. É muitas vezes descrita como geleia.
E o que é uma máquina de marmelada? E porque sua proprietária, Edwina Trout, estava carregando esse troço da Europa para a América a bordo do Titanic?
Acontece que uma máquina de marmelada de 1912 era um dispositivo usado para cortar e descascar as fatias de cítricos na forma, tamanho e textura adequadas para fazer uma marmelada perfeita.
Edwina “Winnie” Celia Troutt tinha 27 anos e viajava de volta para a América após uma visita à Inglaterra, onde ajudou sua irmã a dar à luz ao seu filho. Ela embarcou no Titanic como uma passageira de segunda classe. Quando o navio bateu no iceberg, ela deixou sua cabine para investigar e foi informada do destino do navio.
Ela também viu a equipe preparar os salva-vidas. Ela voltou para contar a seus companheiros de cabine, mas só encontrou uma. Então, vestiu o casaco mais pesado que tinha contra o frio, e incentivou sua companheiro de quarto a se apressar, em um ponto jogando o corset da mulher na água, dizendo a ela não havia tempo para isso.
Winnie estava no bote salva-vidas número 16, esperando para ser salva, quando um homem veio até ela lhe implorando para salvar seu filho. Winnie levou a criança, além de uma escova de dentes e uma Bíblia. Ela não carregou sua máquina de marmelada e mais tarde entrou com uma reclamação pelo bem perdido.
8 – UMA CAIXA DE FILMES
No manifesto de Titanic está listada “uma caixa de filmes” para a empresa New York Motion Picture. Como era o caso com automóveis, equipamentos eletrônicos e fonógrafos, imagens em movimento estavam tornando-se imensamente populares no início de 1900.
The New York Motion Picture era uma das muitas companhias cinematográficas pequenas na área de Nova York e Costa Leste dos EUA (antes da indústria do cinema mudar-se para Hollywood). A empresa foi formada em 1909, e estava operando até cerca de 1914. Era possuída e operada por dois homens, um dos quais, Charles O. Baumann, liderou várias empresas bem sucedidas de imagem de movimento, mais notavelmente a Keystone Film Company.
A vida curta da New York Motion Picture lançou filmes sob as marcas Broncho (para filmes do estilo western), Domino (para comédias) e Kay-Bee (para dramas). Não se sabe qual o tipo de filme estava sendo enviado para Nova York a bordo do Titanic. Face aos acontecimentos do naufrágio do navio, é de se esperar que fossem Kay-Bee, material para filmes de drama.
9 – PERFUMES
Um dos passageiros de primeira classe a bordo do Titanic era um fabricante de perfume da Inglaterra, chamado Adolphe Saalfeld. Ele carregava consigo uma bolsa de couro, na qual tinha 65 frascos de perfumes diferentes.
Como o comércio de perfume em Nova York e na América estava crescendo no momento, ele pode ter viajado com amostras de seu perfume para tentar seduzir potenciais compradores. Ele alegou estar na sala de fumar do Titanic quando viu o iceberg e o navio bateu. Foi para seu quarto, mas deixou para trás a mochila contendo as amostras de seu perfume.
A mochila e os frascos afundaram com o navio e lá permaneceram por 89 anos até 2001, quando foram descobertos pelos membros de uma equipe de busca. Quando trouxeram a bolsa para a superfície, a equipe ficou encantada com o aroma de lavanda e rosas do perfume. Alguns dos frascos tinham quebrado, mas a maioria estava surpreendentemente intacta.
Planos foram imediatamente feitos para decifrar as impressões digitais químicas destas fragrâncias perdidas há muito tempo, na esperança de reproduzi-las hoje, possivelmente com nomes inteligentes, como Eau de Desastres. Saalfeld sobreviveu a bordo do barco salva-vidas número 3.
10 – “KARAIN: A MEMORY”
Na sala de correspondência do Titanic estava um pacote contendo o manuscrito de “Karain: A Memory”, escrito pelo famoso autor Joseph Conrad.
“Karain: A Memory” era um precursor de outro livro de Conrad, “Lord Jim”. Ele foi escrito em 1897, e publicado mais tarde no mesmo ano. Conrad estava enviando o manuscrito a John Quinn, em Nova York, um advogado irlandês-americano que, por um tempo, foi uma figura importante no pós-impressionismo e modernismo literário, e coletor, em especial, de manuscritos originais. Este manuscrito, entretanto, nunca chegou a ele.
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